De onde veio a história de Atlântida?

De onde veio a história de Atlântida?
Editora Globo
REINO PERDIDO: O continente submerso, inventado em 1882, foi inspirado numa história do filósofo grego Platão

Ignatius Donnelly foi deputado federal nos EUA em meados da década de 1860. Dono de uma mentalidade progressista para a época — defendeu os direitos dos negros e dos índios e rompeu com o Partido Republicano por discordar de esquemas de corrupção —, viu sua carreira política definhar na década seguinte e virou escritor. Em 1882, inventou a Atlântida.

O nome “Atlântida” e a ideia de um país desaparecido no Atlântico remontam ao filósofo grego Platão, que cita o reino em dois de seus diálogos — pesquisadores ainda questionam se ele a inventou ou se teria exagerado um evento real, como a destruição explosiva de uma ilha vulcânica. Mas foi Donnelly que transformou a alegoria platônica no que ela é hoje: uma utopia submersa, fonte de ciência e sabedoria, de memória que sobrevive em mitos e lendas.

Seu livro, Atlântida: O Mundo Antediluviano, fez enorme sucesso, desencadeando toda uma era de “estudos atlanteanos” que ainda perdura e seguiu acumulando bagagem: hoje, o continente perdido se tornou fonte abundante de segredos tecnológicos, espirituais, esotéricos — e até de óvnis.

Donnelly escreveu antes de a geologia comprovar a existência de placas tectônicas, cuja configuração demonstra que não haveria espaço, no Atlântico, para um continente inteiro afundar, e antes de os avanços da arqueologia enterrarem de vez a doutrina do “difusionismo” — a ideia de que todas as civilizações da Terra seriam versões transplantadas de uma matriz comum.

O livro não impressionou a ciência e a revista Nature, no mesmo ano em que a obra foi lançada, dizia que o autor não havia entendido especialistas cujas obras usou para apoiar a tese: “Mesmo ao citá-los, o autor nem assimilou-lhes o método, nem compreendeu o significado de seus fatos”.

Mas é improvável que qualquer busca pela Atlântida “verdadeira” ou “original” produza resultados conclusivos.
 


 

LEMÚRIA
O outro continente

Hoje em dia, o nome lêmur é dado a um grupo de primatas da Ilha de Madagáscar, mas no século 19 ele também era aplicado a outros animais, os lóris da Índia.

O fato de haver “lêmures” nos dois lados do Oceano Índico fez que alguns cientistas começassem a especular sobre a possibilidade de que, no passado, teria havido uma ponte de terra sobre esse oceano, chamada de “Lemúria”.

Em 1870, o alemão Ernst Haeckel propôs que todos os primatas — incluindo seres humanos — poderiam ter evoluído neste continente. Ocultistas adoraram a ideia.

Mas a descoberta das placas tectônicas acabou tornando desnecessária, e desmentindo, a existência desse continente perdido.
 



VIA CARLOS ORSI, 42 anos, é jornalista e autor das obras de divulgação científica Livro dos Milagres (Vieira & Lent) e Pura Picaretagem (LeYa). Mantém o blog https://carlosorsi.blogspot.com