Neurologia: É possível controlarmos o esquecimento das memórias?

Neurologia: É possível controlarmos o esquecimento das memórias?

 

 

É possível controlarmos o esquecimento das memórias?Se tivesse uma maneira de esquecer aquele vexame que ocorreu naquela última festa... Na verdade, não existe apenas uma, mas duas maneiras que o cérebro nos oferece para voluntariamente esquecer memórias indesejáveis.

É amplamente aceito que as memórias são formadas pelo fortalecimento das conexões entre as células nervosas, e depois consolidadas pela reativação dos circuitos neurais que as codificaram. Uma vez armazenadas, acreditava-se que as memórias eram relativamente estáveis com o tempo. Há dez anos, entretanto, pesquisadores descobriram outro processo da memória, chamado reconsolidação. Quando uma memória é reativada (chamada para o pensamento consciente), ela é eventualmente reforçada, mas imediatamente após ser chamada, ela é brevemente instável, oferecendo uma janela para ser manipulada.

 

Estudos recentes descobriram que as duas maneiras possíveis de se esquecer memórias indesejáveis é de suprimi-las, desligando o sistema de consolidação, ou então de facilitar para que o sistema de consolidação seja ocupado por memórias substitutas, mais agradáveis.

A supressão de memórias pode ser exemplificada com um estudo feito em camundongos, os quais foram treinados para temer um som específico ao associá-lo com choques elétricos leves. Após o treinamento, eles exibiam comportamentos de medo sempre que o som era tocado, mesmo sem os choques. Mas se os camundongos recebiam um remédio inibidor de síntese protéica logo antes de ouvirem o som novamente, o processo de reconsolidação era bloqueado e o animal não temia mais o som. Por outro lado, também é possível melhorar a reconsolidação para fortalecer a memória, fazendo os camundongos agirem com mais medo ao som.

 

A nossa memória é como aquela brincadeira do telefone sem fio, onde cada pessoa sussurra a mensagem para a próxima da fila. Quando chega à última pessoa, a mensagem foi alterada radicalmente, sofrendo alterações a cada sussurro. Assim como nessa brincadeira, nossa memória distorce uma lembrança cada vez que ela é relembrada. Toda vez que lembramos de um evento do passado, nosso circuitos cerebrais sofrem alterações que podem afetar a maneira que essa lembrança é armazenada, ou reconsolidada. Assim, da próxima vez que nos lembrarmos desse mesmo evento, pode ser que vamos lembrar não do evento original, mas daquilo que foi consolidado na última vez.

 

Essas descobertas trazem diversas implicações da ordem de saúde e até criminal, como no caso de uma testemunha de um julgamento. Pode ser que o seu testemunho seja bem preciso da primeira vez que ela o diz, porque suas memórias não estão tão distorcidas, mas depois disso só tende a piorar.

A manipulação da memória pode ser usada no tratamento de pessoas sofrendo de distúrbio do estresse pós-traumático, sobreviventes de guerras, ou vítimas de estupro, o que pode ser uma coisa boa. Porém, as possíveis consequências de se reprimir deliberadamente as memórias ainda não estão claramente estudadas. Na psiquiatria, já é sabido que sentimentos esquecidos ou reprimidos geralmente se manifestam na forma de reações psicológicas.

 

A memória é também parte integral da nossa identidade. É um diário mental dos eventos que experimentamos e que nos oferece continuidade como indivíduos ao longo da vida. Guardamos algumas memórias felizes, outras nem tanto, e ainda aquelas tristes ou até traumáticas. Coletivamente, porém, o conteúdo do nosso diário mental nos faz quem somos, e ao manipulá-lo nós corremos o risco de perder uma parte da nossa história.

 

A comunidade científica ainda discute as implicações éticas de se manipular a memória, porém se o seu objetivo é fortalecer sua memória para melhorar sua capacidade de lembrar pessoas, nomes, eventos e tudo mais, saiba que não há dúvidas, basta exercitar sua memória. Para isso,é recomendavel utilizar a leitura, jogos lógicos, interesse, cálculos e etc.

 

Fontes:

Roland G. Benoit, Michael C. Anderson. Opposing Mechanisms Support the Voluntary Forgetting of Unwanted Memories. Neuron, 2012; 76 (2): 450

Donna J. Bridge, Ken A. Paller. Neural Correlates of Reactivation and Retrieval-Induced Distortion. The Journal of Neuroscience, 29 August 2012, 32(35): 12144-12151