Neurologia: Falta de sono pode provocar distúrbios psíquicos

Neurologia: Falta de sono pode provocar distúrbios psíquicos

Não há dúvida que as pessoas precisam dormir: estudos associam a falta de sono a várias disfunções físicas e psíquicas, desde problemas no sistema imunológico, déficits cognitivos, até o descontrole do peso.

Na verdade, o psicólogo Matthew Walker da University of California, em Berkeley, avalia que “quase todas as desordens psiquiátricas mostram alguns problemas com o sono.” Antigamente os pesquisadores acreditavam que problemas psiquiátricos é que desencadeavam problemas do sono. Novas pesquisas, no entanto, sugerem que o que ocorre, na verdade, é o inverso, ou seja, que os problemas com o sono causam alguns distúrbios psíquicos.

A equipe de Walker e seus colaboradores da Harvard Medical School chegaram a essas conclusões publicadas recentemente na Current Biology, depois de estudarem 26 estudantes saudáveis, com idades entre 24 e 31 anos, que passaram algumas noites acordados (estudando) ou dormindo a noite toda.

Quatorze deles ficaram 35 horas seguidas sem “pregar os olhos” antes de serem submetidos a um exame de ressonância magnética funcional (fMRI, na sigla em inglês) que esquadrinhava o cérebro dos participantes enquanto viam um conjunto de 100 fotos que se tornavam gradativamente mais perturbadoras. As primeiras imagens eram fotos de cestos de vime vazios sobre uma mesa; depois, de uma tarântula sobre o ombro de uma pessoa e, finalmente, fotos de vítimas de queimaduras e outros acidentes traumatizantes.

Os pesquisadores monitoraram principalmente a amígdala ─ uma estrutura cerebral que decodifica a emoção ─ e observaram que os dois grupos de voluntários exibiam o mesmo padrão de atividade cerebral quando eram mostradas imagens leves. Mas, quando as cenas se tornavam mais assustadoras e violentas, a amígdala dos que tiveram privação do sono “surtou”, mostrando atividade 60% maior que em relação à resposta normal. Além disso, os pesquisadores observaram que entre os que ficaram sem dormir havia cinco vezes mais neurônios transmitindo impulsos no cérebro.

Walker descreveu a resposta emocional ampliada, quando se está cansado, como “profunda,” acrescentando: “nós nunca vimos uma diferença tão grande entre dois grupos em nossos estudos anteriores.”

A equipe também verificou os resultados da fMRI para determinar se qualquer outra região do cérebro tinha um padrão similar de atividade, o que indicaria que as regiões do cérebro estavam se comunicando. Nos participantes normais, a amígdala parecia estar interagindo com o córtex medial pré-frontal ─ uma camada externa do cérebro que ajuda a contextualizar experiências e emoções. Mas nos cérebros cansados, a amígdala parecia estar “reconectada” a uma área do cérebro chamada locus coeruleus, que secreta norepinefrina ─ um precursor do hormônio adrenalina que aciona reações do tipo atacar ou fugir.

“O córtex medial pré-frontal é um policial do cérebro emocional,” observa Walker. “Ele nos torna mais racionais. A conexão inibidora piora quando as pessoas sofrem privação de sono. A amígdala parece ser capaz de ser estimulada repentinamente. Pessoas nesse estado parecem exibir um comportamento emocional pendular, passando de aborrecidas ou irritadas a apáticas ou sonsas, momentaneamente.”

“Parece haver uma relação causal entre o sono afetado e algumas desordens e sintomatologias psiquiátricas que temos visto,” comenta Robert Stickgold, professor associado de psiquiatria na Harvard Medical School, não envolvido no estudo. Ele menciona pesquisas relacionando a apnéia do sono ─ em que a respiração é interrompida ─ com déficits de atenção, hiperatividade e evidências de conexão entre depressão e insônia como exemplos. “Pode ser que regiões mediais frontais enviem ao resto do cérebro comandos para relaxar, ele avalia, e aqueles circuitos extremamente cansados ou alterados pela falta de sono.”

A equipe de Walter agora, planeja examinar os efeitos da interrupção de certos tipos de sono, como o REM ou o de ondas lentas. “Eu acredito que podemos começar a pensar em uma nova função para nosso cérebro, ao dormir.” O sono, na verdade, prepara nosso cérebro para as interações sociais e emocionais do dia seguinte.